Caros esposos, acabaste de vos unir pelas santas promessas, que acarretam novos e graves deveres, e eis que agora vos apresentais diante do Pai comum de todos os fiéis, para lhe ouvir as exortações e receber a bênção.
Pedimos-vos hoje que olheis para a Santíssima Virgem Maria, cujo título de Imaculada Conceição a Igreja celebrará depois de amanhã. Esse título afetuoso, que preludia todas as outras glórias de Maria, é um privilégio único, a ponto de Ela utilizá-lo para se identificar: 'Eu sou, disse ela à Santa Bernadete na gruta de Massabielle, eu sou a Imaculada Conceição.'
Uma alma imaculada! Quem dentre vós, ao menos nos melhores momentos, não desejou ter uma? Quem não ama o que é puro e imaculado? Quem não admira a brancura dos lírios refletidos no espelho de um lago límpido, ou os cumes nevada que refletem o azul do firmamento? Quem não inveja a alma cândida de Inês, de Luiz Gonzaga, ou de Teresinha do Menino Jesus?
O homem e a mulher eram imaculados quando saíram das mãos criadoras de Deus. Manchados depois pelo pecado, tiveram de começar, pelo sacrifício expiatório das vítimas sem mancha, a obra de purificação a que somente 'o preciosíssimo sangue de Cristo, o do Cordeiro imaculado e sem contaminação' (I Pd 1, 19) concedeu a eficácia redentora. E Jesus Cristo, para continuar a Sua obra, quis que a Igreja, a Sua Esposa Mística, fosse 'sem mácula, nem ruga... mas santa e imaculada' (Ef 5, 27). Caros esposos, esse é precisamente o modelo que o grande Apóstolo vos propõe: 'Maridos amai a vossas esposas, como também Cristo amou a Igreja' (Ef 5, 25), pois o que enobrece o sacramento do matrimônio é a relação existente entre ele e a união de Cristo com a Igreja (cf. Ef 3, 32).
Talvez penseis que a idéia de uma pureza sem mancha se adequa exclusivamente à virgindade, ideal sublime ao qual Deus não convida a todos os cristãos, mas tão somente a almas de elite. Vós conheceis algumas dessas almas, mas apesar de admirá-las, decidistes que a vossa vocação era outra. Sem se inclinar ao extremo da renúncia total dos gozos terrenos, vós, ao seguir a via ordinária dos mandamentos, desejais ver ao vosso redor uma gloriosa coroa de filhos, fruto da vossa união. E, todavia, o estado do matrimônio que Deus desejou para os homens em geral pode e deve ser puro e sem mancha.
Quem cumpre fiel e diligentemente os deveres de estado é imaculado diante de Deus. Deus não chama todos os seus filhos ao estado de perfeição, mas os convida todos a perfeição do próprio estado. 'Sede, pois, perfeitos, dizia Jesus, como também vosso Pai celestial é perfeito' (Mt 5, 48). Vós já conheceis os deveres da castidade conjugal, que exigem uma grande coragem, às vezes heróica, e uma confiança filial na Providência; mas a graça do sacramento vos foi dada precisamente para enfrentar tais deveres. Não vos desvieis por causa dos pretextos hoje em voga, nem por causa dos exemplos que, infelizmente, são corriqueiros.
Escutai de preferência os conselhos do anjo Rafael ao jovem Tobias, que hesitava em desposar a virtuosa Sara: 'Ouve-me, e eu te mostrarei sobre quem o demônio tem poder: são os que se casam, banindo Deus de seu coração e de seu pensamento' (Tb 6, 16-17). Então Tobias, iluminado pela exortação angélica, disse a sua jovem esposa: 'Somos filhos de santos, e não nos devemos casar como os pagãos, que não conhecem a Deus' (Tb 8, 5). Não vos esqueçais de que o amor cristão tem um fim muito mais elevado que uma mera satisfação fugaz.
Escutai, enfim, a voz da consciência, que repete no fundo do vosso coração a ordem de Deus ao primeiro casal humano: 'Sede fecundos e multiplicai-vos' (Gn 1, 22). Assim, segundo a expressão de São Paulo, 'seja por todos honrado o matrimônio, e o leito conjugal sem mácula' (Hb 13, 4). Pedi está graça especial à Santíssima Virgem, no dia da sua próxima festa.
Para se tornar a digna Mãe de Deus, Maria foi imaculada desde a concepção. Por isso a Igreja, na liturgia, entoa a seguinte oração, que é um eco dos seis dogmas: 'Deus, que pela Imaculada Conceição da Virgem Maria preparaste a Vosso Filho uma morada digna d'Ele...'
Essa Virgem imaculada, que se tornou Mãe em razão de outro privilégio divino e único, saberá então compreender o vosso desejo de pureza interior e a vossa aspiração à felicidade familiar. Quanto mais santa e isenta de pecado for a vossa união, tanto mais vos abençoarao Deus e a Sua Mãe puríssima, até o dia em que a Bondade suprema unir para sempre no Céu aqueles que se amaram cristãmente na terra."
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