segunda-feira, 10 de março de 2014

Verdadeira fidalguia: humildade e grandeza

    Uma sociedade imoral ou amoral, que já não sente na consciência e já não demonstra nos actos a distinção entre o bem e o mal, que já não se horroriza com o espectáculo da corrupção, que a desculpa e que a ela se adapta com indiferença, que a acolhe com favor, que a pratica sem perturbação nem remorsos, que a ostenta sem rubor, que nela se degrada, que se ri da virtude, está no caminho da ruína.
    A alta sociedade francesa do século XVIII foi, entre muitos outros, um trágico exemplo disso. Nunca uma sociedade foi mais refinada, mais elegante, mais brilhante, mais fascinante. Os mais variados prazeres do espírito, uma intensa cultura intelectual, uma arte finíssima de agradar, uma requintada delicadeza de maneiras e de linguagem, dominavam aquela sociedade externamente tão cortês e amável, mas na qual tudo – livros, contos, figuras, alfaias, vestidos, penteados – convidava a uma sensualidade que penetrava nas veias e nos corações, e na qual a própria infidelidade conjugal quase já não surpreendia nem escandalizava. Essa sociedade trabalhava assim pela sua própria decadência e corria para o abismo cavado pelas suas próprias mãos.
Muito diferente é a verdadeira fidalguia: esta faz resplandecer nas relações sociais uma humildade cheia de grandeza, uma caridade livre de qualquer egoísmo, de qualquer procura do próprio interesse.
Não ignoramos com quanta bondade, doçura, dedicação e abnegação, muitos, e especialmente muitas de vós, nestes tempos de infinitas misérias e angústias, se curvaram sobre os infelizes, souberam irradiar em torno de si, em todas as formas mais avançadas e eficazes, a luz do seu caridoso amor. E este é outro aspecto da vossa missão.

    Pois – não obstante preconceitos cegos e caluniosos – nada é tão contrário ao sentimento cristão e ao verdadeiro sentido e fim da vossa classe, em todos os países, mas particularmente nesta Roma, mãe de Fé e de civilização, quanto o estreito espírito de casta. A casta divide a sociedade humana em secções ou compartimentos separados por paredes impenetráveis. O cavalheirismo, a cortesia, é de inspiração sobretudo cristã; é o vínculo que une entre si, sem confusão nem desordem, todas as classes. Longe de obrigar-vos a um isolamento soberbo, a vossa origem inclina-vos antes a penetrar em todas as ordens sociais, para comunicar-lhes aquele amor à perfeição, à cultura espiritual, à dignidade, àquele sentimento de compassiva solidariedade, que é a flor da Civilização Cristã.
Na presente hora de divisões e de ódios, que nobre missão vos foi consignada pelos desígnios da Providência Divina! Cumpri-a com toda a vossa Fé e com todo o vosso amor! Com tal augúrio e em atestado dos Nossos paternais votos para o ano já iniciado, concedemos de coração, a vós e a todas as vossas famílias, a Nossa Bênção Apostólica

(Discorsi e Radiomessaggi di Sua Santità Pio XII, Tipografia Poliglotta Vaticana, 14/1/1945, pp. 273-277).

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